domingo, 21 de junho de 2009

Lavoura Arcaica e os limites


Há muito de teatro no cinema. Há muito de cinema no teatro. As Artes que cada vez se mesclam mais e mais, e deixam de ser apenas uma coisa só: "Mas esse é um espetáculo é de Teatro? Não seria dança? Música?" Alguns espetáculos são tão cheios de nuances que não conseguem ser classificados em uma categoria única. É a projeção e o vídeo que invadem os palcos e se confundem com a movimentação do ator; é um canto numa tela de cinema que se confunde com um texto absolutamente literário; é uma poesia num concerto de música que faz com que esse mesmo concerto seja muito mais do que isso. São todos espetáculos: abarcam tudo o que se pode abarcar. São espetáculos: superam os limites que os denominam.
Lavoura Arcaica (2001), longa-metragem de Luiz Fernando Carvalho, é um espetáculo. O filme, com roteiro baseado no romance homônimo de Raduan Nassar, é preenchido por muita literatura durante todo o tempo. Filme longo, textos in off, textos falados, textos poéticos, textos coloquiais-poéticos que fazem com que o espetactador se sinta na situação mágica de se estar lendo um livro. Contudo, é mais que do que isso. As imagens, verdadeiros quadros-fotografias-paisagens que consomem a tela se mistura à música que conduz aquele que assiste para dentro da estória que se configura que, por sua vez, une-se à vida dos atores, atores esses que quase não parecem atores de tão vivos - uma interpretação latente e real própria de muitos espetáculos de teatro.
Lavoura Arcaica tem uma natureza difícil de se categorizar. É um conjunto de coisas juntas e misturadas. Algo que ultrapassa os limites e palavras. Exatamente como a vida.
Nos extras do filme, o diretor fala que toda a equipe da Lavoura Arcaica passou cerca de quatro meses vivendo numa fazenda, todos juntos, isolados das outras coisas, transformando o encontro do longa metragem muito mais do que uma sequência de ensaios. Era preciso viver a estória de Lavoura Arcaica para realizar o filme proposto. "Como conhecer as coisas senão sendo-as?" A frase, de Jorge de Lima, foi bastante mencionada por Luiz Fernando Carvalho durante toda a trajetória do filme.
Para alcançar a força de Lavoura Arcaica, os atores precisaram superar a idéia de interpretação. Superar os limites impostos pelas categorias. Pensar que não se estava fazendo apenas um filme. Misturar-se à música, às artes plásticas, ao teatro, à literatura, à vida. Para esse tipo de proposta, foi necessário ser.
Termino com uma frase de Tom Jobim: "Esse negócio de entender uma coisa, tem que amar."

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